Quase todos os dias, quando volto da PUC, desce, na mesma parada de ônibus que eu, uma deficiente visual. Ela estuda Pedagogia na nossa instituição e utiliza dois ônibus todos os dias, tanto para ir quanto para voltar da faculdade. Quando cruzo com ela, eu obviamente a ajudo: a atravesso no corredor de ônibus da terceira perimetral, depois a atravesso na sinaleira e a levo à outra parada de ônibus. Vejo também outras pessoas fazerem isto com ela, mas também já a vi fazer esse caminho sozinha. Essa estudante lança mão da sua audição aguçada para atravessar as ruas, e tem sorte por sempre ter acertado. Atravessa aquele corredor de ônibus sem saber ao certo sem tem algum ônibus vindo e, a mesma coisa sobre os carros, quando está na outra sinaleira. Creio que, além de ser acostumada com tal rotina, ela é uma pessoa de sorte.
Com essa descrição, quero chegar no ponto de que a nossa sociedade é feita para pessoas ditas “normais”. Quem possui algum tipo de deficiência quase não tem espaço. Admiro esta moça que quer levar uma vida dentro dos padrões, não deixando que sua deficiência visual atrapalhe isto. Em uma das minhas conversas com ela, no caminho da parada em que ela pega o segundo ônibus, ela já me contou que faz estágio e que, como toda mulher, sonha em casar e ter filhos.
É bonito de ver a coragem que ela tem para enfrentar as adversidades que a vida lhe proporcionou. É, também, lamentável que nem todos os deficientes possuam essa vontade de viver, pois a nossa sociedade os exclui. Assim como ela, existem também deficientes auditivos, deficientes físicos, deficientes mentais, enfim, inúmeros tipos de deficientes que todos os dias lutam para ter uma rotina normal. Nossa sociedade preconceituosa os torna alvo de exclusão. São pessoas que têm dificuldade em inserir-se no mercado de trabalho, em conviver em ambientes sociais, que são motivo de chacota e, até mesmo, possuem dificuldades de locomoção.
Hoje, já existem políticas públicas que visam trabalhar a inclusão destes na sociedade e promover seu bem estar. Como exemplo, podemos citar a política de cotas para deficientes em empresas, reservando de 2% a 5% dos seus cargos para deficitários. Porém, ainda falta conscientização da população em geral. É imprescindível que eles sejam tratados com equidade: são diferentes e devem ser tratados como seres diferentes, pois fechando os olhos para suas deficiências, estaremos excluindo-os.
Em Porto Alegre, conheço apenas duas sinaleiras com alerta sonoro, que avisam o deficiente visual quando a sinaleira está de fato fechada, para eles conseguirem atravessar. Na sinaleira em que a moça que eu cito acima atravessa, não tem. Eles podem ser a minoria, mas isso não significa que deve-se ignorá-los. O governo deveria implantar em todas as sinaleiras um sinal sonoro, pois nunca se sabe onde/quando um deficiente visual vai transitar e ele não deve estar limitado a seu direito de passear pelas ruas da cidade.
Outro aspecto a ser considerado diz respeito aos ônibus para os cadeirantes e as rampas para acesso às ruas. Hoje, é crescente o número de ônibus que está apto para pessoas com esse tipo de deficiência, mas ainda não é o suficiente. Um cadeirante que precisa fazer uso todos os dias de ônibus tem direito de ir à empresa e solicitar que nos horários necessários por ele tenha ônibus com porta especial. Mas isso é de fato suficiente? Acredito que não. Ele deve ter o famoso direito de ir e vir no sentido literal da palavra. Todos os ônibus deveriam ser aptos para os cadeirantes. Não se pode escolher a hora na qual sair ou anunciar quando necessitará da condução. Deve-se sair a hora que se quiser, é assim que todos nós nos comportamos, e com todos deve ser igual.
Enfim, é necessário que aos poucos, nos demos conta dessas lacunas que existem em nossa sociedade e que, aos poucos, consigamos preenchê-las. Afinal, NORMAL É SER DIFERENTE.